16.1.07

corações não têm mãos



Tens o olhar de quem sabe que alguém veio no mundo pra te ver e nunca te encontrou. És do tamanho desta dor. Dessa ausência. E tua magra figura é a revolta pura de tanta inocência. Por isso fazes de teus dias a prática secreta das frias emoções. Tuas atitudes são tardias para que deixem nos outros a marca. Tens o sal da boca dos leões de zoológico. Eu te criei mais frágil, mais ameno, mais condescendente. Te criei um cérebro ativo e impaciente, jamais calculista. Te vi: o homem dentro do menino. Mas és velho como o tronco do carvalho, viajas neste mundo para explicar teu primeiro galho na raiz. Fiz de ti um risco de giz para poder te amar, e a sombra se mostrou e me fez ver o que eu nunca quis. Agora és o borrão dessa natureza forte, quase desumana, porque teimo ser humana a miragem que perdi. Eu te menti. Como posso ser tão mesquinha? Não és uma sombra minha, mas a alma gêmea do tufão em movimento. És um despertar sangrento e uma gargalhada, tudo ao mesmo tempo. És o espelho do que eu não queria ser em mim. E sou. Não me surpreendes, mas me fazes estremecer pela existência de teu andar demente. Será isso um elogio? Não, talvez uma toada de paixão e glória entre condenados, entre seres desconfiados do amor que existe. Por aí. Por aqui. Amor é o louco no céu implorando para que seus pés toquem a terra.

(Somos detalhes de um esquema grandioso que nos foge ao entendimento,porque a válvula que bombeia sangue para esse corpo que cultuamos mora dentro do coração. E corações não têm mãos.)

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