
28.1.07
25.1.07
vestido-baile

23.1.07
22.1.07
mulher de rosa na mão

Depois fui me espreguiçando e vi que estou arrítmica.
Com o tempo, me aventurando, conclui que tísica.
Depois, com o sol fui me banhando e descobri a física.
Agora que já estou lá fora vou conferir minha métrica.
Disponho de um mundo de coisas mas não encontro estética.
Calculo que já vou chegando ao ponto da bulímica.
Mas vejo a lua despontando, o amor se mensurando, e a volta eu vou dar!
coisas boas:
http://www.christianeganzodecastro.blogspot.com
http://www.boucheville.blogspot.com
21.1.07
depois de modi
19.1.07
m o d i g l i a n i

http://www.modigliani-amedeo.com
(Ouvindo Ode to innocence, Sasha Lazard)
“Quando eu conhecer tua alma, pinto teus olhos.”
Modigliani para Jeanne
Vi em Modigliani o cavalo. Não o cavalo nascido, não que ele tivesse na raiz o cavalo, nem no sentido eqüino, não. O cavalo em Modigliani vai mais pro relinchar de satisfação. O relincho sendo aquela manifestação moldável em si, a manifestação da vida simples, o relincho amoroso de exaltação, prazer, satisfação, gosto. E olha, a vida de Amedeo Modigliani foi cheia de desgostos. Daí a importância de se dizer: Modigliani, o homem que relinchava de prazer, de satisfação, de exaltação. Sobretudo na atitude de jogar tintas na palheta, misturá-las, escolher um pincel entre os muitos no copo sujo e alto, dar um gole na garrafa de tinto e, sem mais aquela, num soco não mudo mas espalhafatoso, assim, começar a pintura, e para que não lhe escapasse o sonho, o sonho por segundos nascido na idéia, o sonho que, por deus, não escapasse, oh vida de desgostos e rusgas, oh vida dura de Amedeo... por isso a rapidez com que lança o pincel na tela, para que lhe compreenda, lhe dê um colo esta tela muda, surda e branca, que se torne muito breve quase imediatamente a cúmplice do amor de Modi, do suor de Modi, da alegria, sim, da alegria!.... ponte diáfana entre o sim e o não, ponte esbodegada, e ainda ponte, entre a gota e a gota, entre o rito e o riso, oh, ponte de neve sobre as alegrias!!!! Galopa, então, o cavalo Amedeo Modigliani, galopa o puro sangue nunca domado Amedeo, galopa e salta sobre o vale profundo da agonia, e quanto precisa Modigliani, preciso, da mão mais rápida que o pensamento, do movimento mais veloz que o vento para lhe garantir uma pincelada a mais, quando – e só neste quando - o selvagem puro sangue relincha e não está acuado, mas sim revigorado na proeza do galope velocíssimo. Ave, Modigliani, o anjo da tristeza voa alto, para o além, se o cavalo selvagem expõe e compõe uma formosura, de formosuras mesmo engendrada, de formosuras mesmo cavada, de formosuras mesmo lavada, de formosuras mesmo erguida, de formosura, só dela, a beleza desta vida.
azul

O gelo é digno. Foi assim que ela reconheceu, quando te debruçaste sobre o ar, a ártica construção de gelo no oceano grande, uma construção tão azul, em pontas inanimadas, em depressões inanimadas, o congelamento de séries, séries, séries de longitudes e coerências, tu, convexo e tão côncavo sobre a enorme água, também digna.
O gelo é enorme. Foi assim que ela reconheceu, quando te debruçaste sobre o ar, a grande construção de gelo no oceano ártico, uma construção tão convexa, em pontas enormes, em depressões enormes, o congelamento de séries, séries, séries de côncavos e dignos, tu, azul e tão longo sobre a coerente água, também inanimada.
O ar é azul. Foi assim que ela reconheceu, quando te debruçaste sobre o gelo, o grande oceano de gelo na construção ártica, um oceano tão digno, em congelamentos enormes, em depressões enormes, as pontas de séries, séries, séries de côncavos e convexos, a água, inanimada e tão coerente sobre o longo tu, também azul.
groenlândia

ah, dessa vez

lá longe

cative

Cative, uma multidão, gira nos calcanhares para alcançar o último da fila.
- Esta fila é pro Benjamim?
- Não sei. A gente vai ver Garfield.
- Obrigada.
Cative, uma multidão, gira nos calcanhares mais uma vez.
- Moço, onde é a fila pro Benjamim?
- Não tem fila ainda. A sala não foi liberada.
- Falta cinco minutos.
- Pode esperar por aqui, já vamos abrir.
Cative, uma multidão, pega um drops na bolsa e enfia na boca. Cumprimenta um cara conhecido. Como é mesmo o nome dele? Sem registro. Procura as chaves da casa no bolsinho interno da bolsa, sempre desconfiada de ter deixado a chave na porta do apartamento, ou no banco da lotação, ou. Sala um liberada. Cative, uma multidão, entra no cinema vazio. Escolhe a fileira do meio e a poltrona do meio. O cara sem registro é ator de telenovelas. Daí. E esse audiovisual de instruções de “como usar sua sala de cinema” é in-su-por-tá-vel. Também o barulho dos sacos de pipocas. E a perna do vizinho de trás batendo nas costas da poltrona.
Hoje você fez bonito, hein, Cative? O comercial do banco trinta horas também não dá mais pra agüentar. Da próxima vez, vai entrar atrasada na sessão. Faz favor! Essa menina se mima demais. Três livrarias num dia só. Nenhum desembolso. Há. Cative, você se supera. Mas o filme parece ser bom, pela primeira cena. Será que você consegue parar de fumar? Pé nas costas da poltrona. Queria dizer: olha, dá pra você parar de bater o pé nas costas da minha poltrona? Das dez mil e oitocentas vezes que já esteve num cinema na vida, umas dez mil setecentas e oitenta e nove vezes, seguramente, foram perturbadas por um pé. Sacos de pipoca não incomodam tanto, o barulho vai se incorporando. Essa atriz é linda. Nada nela é imperfeito. Nenhuma parte torta. Podia ter convidado a Nill. Mas ela até lixa as unhas durante o filme! Mesmo assim. Quanto cinema pra tantas horas. E que horas. Horas de sossego, de esfregação, de palavra. Deixa.
hello
cântico para enriquecer tua alma

a tua ausência é o rio divisor
que não passa em minha cidade
que não admoesta os vizinhos com as cheias e as vazantes
é o delta que existe lá no egito
e não tem vertente aqui
por isso, caro amor,
o cãntico se transforma em palavra mole que todo mundo diz
e não chega aos teus ouvidos
mas deixe que o rio do egito respingue no rosto teu
e que as águas murmurem para lá dos montes altos
e o cântico saia disfarçado
em música de rádio nos automóveis
é esta a ausência
que é tua, até ela
pois que nada há de meu num curso forte e desorientado que atravessa o egito
para curtir:
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17.1.07
espaço é possibilidade: em terra de gato, quem é rei abre o olho
E eu ia pensando, pensando, e me deparando com o gosto que tem o ato da escrita. O comportamento da escrita. O peso de uma palavra e depois outra. E a liberdade do espaço entre elas. E penso que eu queria ser o gato Emanuel da Lygia Fagundes Telles. Um gato transformado em possibilidade. Mentira branca que a personagem aplica só pra não ficar de fora do grupo que tem. Tem o quê? Homem, mulher, hierarquia, sorte, muito medo. E a gente tem medo é do peso das palavras, da possibilidade que se abre através das palavras, e tem medo do espaço que elas permitem que exista. Uma menina inventa que Emanuel é o nome do novo namorado dela. Muito diferente da outra, a amiga, que tem um namorado que se chama sei-lá-o-quê. E a diferença está no espaço. O espaço que a protagonista do conto de Lygia cria para si, dando uma chance aos outros. Sim, porque ela sabe que Emanuel é o nome do gato que ronrona nos pés dela de noite. Assim como eu penso agora que uma palavra e depois outra ficam escritas pedindo que eu as leia e crie algo de novo no espaço entre elas. Complicado, isso. Complicado, sim. A gente querer expandir a vida, dar uma chance para o dia de hoje, fazer desse dia aquele que teria, na nossa imaginação, 28 horas. 33, sei lá. Um pouco mais. Uma respiração a mais: um olho desenhado a batom no espelho, um olho vivo, uma imagem viva que não tem semelhança com o olho nu, mas que é a tal da possibilidade. Invento um olho de batom e driblo o meu medo, a minha desorientação, a angústia medonha que vem de noite me pegar pelo pé, e eu? Eu chuto. Fica o gosto azedo da angústia, de uma coisa fora de lugar que sempre teve seu lugar guardado em mim, entretanto. Entre tantos espaços, condicionamentos, e vontades de ser o que sou sem dar satisfação pra ninguém. Essa a idéia do gato Emanuel. Nome bíblico ou de rei. Nome que produz no ouvido dos outros um efeito de palavra nobre. E a coisa da palavra, escrita, falada, produz esse fenômeno: a possibilidade de dar um significado novo. E de ler uma palavra através da outra. Por que, quando pequenas, aprendíamos a dizer o verso “batatinha quando nasce se esparrama pelo chão/menininha que namora põe a mão no coração”? Por causa do medo. De que botássemos a mão em outro lugar muito mais interessante. Para que não criássemos a possibilidade do desejo do sexo do outro. Para que nos apaixonássemos romanticamente e guardássemos essa estória toda que eu escrevi aí em cima num baú velho, cheio de quinquilharias que um dia mostraríamos aos netos. Anseio pelo gato Emanuel. E pelo olho que vou desenhar com batom agora mesmo no meu espelho.
16.1.07
corações não têm mãos

Tens o olhar de quem sabe que alguém veio no mundo pra te ver e nunca te encontrou. És do tamanho desta dor. Dessa ausência. E tua magra figura é a revolta pura de tanta inocência. Por isso fazes de teus dias a prática secreta das frias emoções. Tuas atitudes são tardias para que deixem nos outros a marca. Tens o sal da boca dos leões de zoológico. Eu te criei mais frágil, mais ameno, mais condescendente. Te criei um cérebro ativo e impaciente, jamais calculista. Te vi: o homem dentro do menino. Mas és velho como o tronco do carvalho, viajas neste mundo para explicar teu primeiro galho na raiz. Fiz de ti um risco de giz para poder te amar, e a sombra se mostrou e me fez ver o que eu nunca quis. Agora és o borrão dessa natureza forte, quase desumana, porque teimo ser humana a miragem que perdi. Eu te menti. Como posso ser tão mesquinha? Não és uma sombra minha, mas a alma gêmea do tufão em movimento. És um despertar sangrento e uma gargalhada, tudo ao mesmo tempo. És o espelho do que eu não queria ser em mim. E sou. Não me surpreendes, mas me fazes estremecer pela existência de teu andar demente. Será isso um elogio? Não, talvez uma toada de paixão e glória entre condenados, entre seres desconfiados do amor que existe. Por aí. Por aqui. Amor é o louco no céu implorando para que seus pés toquem a terra.
(Somos detalhes de um esquema grandioso que nos foge ao entendimento,porque a válvula que bombeia sangue para esse corpo que cultuamos mora dentro do coração. E corações não têm mãos.)
como se ouvisse música

na cadência do samba
conquistou uma gargalhada que se ouviu no oiapoque
e comeu da mão de um bêbado na praça quinze
quem duvida? está lá
mas você não acredita porque é urbano
porque levanta às seis e pega a avenida
surge numa sinaleira, boceja pros passantes
cai na mesa de trabalho e joga teu corpo na obsessão
você não pode acreditar, compreendo
você almoça com tíquete
uma mistura quente que te escorre a goela
pra voltar aos números
resultados virtuais que enchem a cabeça
e te afastam da verdade, e é por isso
que você não acredita
em quem comeu da mão de um coitado
que dorme no banco quebrado e nunca troca as roupas
você é urbano
está contente com os aumentos
assim você tem de contar dinheiro
sentir que produziu no último mês
ser honesto, vinte e quatro horas e
vencer o assassino que existe aí dentro
camarada você nunca foi, nem tinha nascido
quando inventaram o sonho das igualdades
balão

Balão balão
Será meu último refrão
Antes que as escotilhas se abram ao mar
Antes que as naves presas se lancem no ar
Era dia de balão na minha aldeia
Era dia de olhar pro céu tão alto
Era dia de fazer a maior ceia
Porque o ponto de partida agora é salto
Eu não te vejo de sal
Não te vejo de mel
Não te vejo de mal
Eu só te vejo de céu
De garganta ao léu
De perfume do mato
Só se subir no balão
Acabo esse refrão
Pra te dar um coração
Vem ver
O balão que subindo
Vai deixando e partindo
Um coração de ser
ferramenta de viver

...e o silêncio escutou

pelo silêncio
rodas pela casa
com a cara
coberta de jóias raras
boca, olhos, nariz
pele clara
e o silêncio te encontra e te vê
o silêncio, esse mendigo
entre os discos e a tevê
ah, agora é só silêncio
(e nem dizes)
rodas pela casa
quinze pra uma
noite diurna
tempo pra fazer
café, conforto, carinho
tempo pra afofar o ninho
no entanto...
(rodas pela casa)
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